A produção de energia eólica e solar no município de Serra do Mel-RN, na região Oeste do Rio Grande do Norte, está ameaçada por dois fatores: cortes na produção pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico - ONS (curtailment) e um processo judicial movido pela CUT, FETARN e SAR. Em contato com o MOSSORÓ HOJE, os colonos disseram que na hipótese da Justiça julgar procedente esta Ação Civil Pública, 28 dos 36 parques terão que ser extintos nas vilas da Serra do Mel, tirando da renda de mais ou menos 400 famílias e dando um lucro aos advogados que assinam a ação de cerca de R$ 20 milhões de reais, além de um fundo de R$ 106 milhões. Ao contrário do que alega a Ação Civil Pública, os colonos dizem que convivem pacificamente com as eólicas, inclusive, com o que recebem, estão restaurando os pomares, fazendo outros cultivos e passando a criar gado.
Veja ação civil pública contra a Voltalia
O curtailment ocorre quando usinas geradoras são forçadas a reduzir sua produção devido a necessidades operacionais do sistema elétrico. Isso pode acontecer por diversos motivos, como excesso de oferta em relação à demanda ou limitações na capacidade de transmissão. Os cortes na produção de energia impostos pela ONS deve reduzir drasticamente o faturamento de 2025 das empresas que operam na produção de energia no Rio Grande do Norte. Na Serra do Mel, já são centenas de torres eólicas paradas. O mesmo pode ser observado em outras regiões do Rio Grande do Norte, sendo motivo de preocupação das autoridades na área de geração de energia.
Como se já não bastassem os dados causados pelo curtailment, a Federação Única dos Trabalhadores – CUT, Federal dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado do Rio Grande do Norte – FETARN, e o Serviço de Assistência Rural e Urbano – SAR, da Igreja Católica, acionaram a Justiça do Rio Grande do Norte contra a Voltalia, principal empresa que produz energia no município de Serra do Mel.
Se dizendo representantes dos trabalhadores de Serra do Mel e também dos direitos humanos, a CUT, FETARN e SAR estão exigindo indenização coletiva R$ 106.425.000,00 da Voltalia, para ser colocado num fundo que será administrado por eles e o Ministério Público Estadual do Rio Grande do Norte. Pedem também R$ 100 mil para cada trabalhador da Serra do Mel que comprove ter a síndrome da Turbina Eólica e mais R$ 100 mil para cada colono que tiver arrendado 100% do lote a Voltália. A Ação Civil Pública é assinada pelos advogados, Felipe Gomes da Silva Vasconcelos, Antônio Fernando Megale Lopes e José Eymard Loguercio, representando a CUT, FETARN e o SAR, da Igreja Católica.
Ocorre que os moradores da Serra do Mel, de forma massiva, reagiram, através da mídia e fazendo abaixo assinado, negando ter delegado poderes a estes advogados e tais entidades para representá-los. Nem os conhecem. Expressaram isto em Audiências Públicas realizada na Câmara Municipal de Serra do Mel e também na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte. Conversamos com os moradores da Serra do Mel, especificamente com os moradores da Vila Amazonas, primeira a fechar contrato de arrendamento com Voltalia para produção de energia limpa, sobre as alegações dos advogados na Ação Civil Pública.
“Antes de mais nada, é preciso ressaltar que não existe um só cidadão da Serra do Mel diagnosticado com esta síndrome da Turbina Eólica e os contratos foram firmados com a Voltalia, depois de quase 1 ano de nossa assessoria jurídica, isto há mais de dez anos, negociando as cláusulas de arrendamento dos lotes da Vila Amazonas, o qual foi a primeira região da Serra do Mel a instalar parques eólicos e gerar renda coletiva entre os colonos”, explica Crispiniano Neto.
Quando as vantagens do contrato, Crispiniano Neto disse que os moradores da Vila Amazonas receberam propostas de outras grandes companhias, inclusive da Estatal Chesf, mas que optaram por fechar proposta com a Voltalia, que era mais justa com os colonos. “Aqui, nem todos os lotes têm torres, mas todos os colonos recebem indenização mensal por igual”, destaca.
Também é alegado na peça assinada pelos advogados do Distrito Federal, que os animais e aves silvestres sumiram da Serra do Mel. Sobre esta alegação, Crispiniano Neto mostrou o terreiro de sua casa, com muitos pássaros. “Aqui vem, às vezes, até seriemas, tatus e pebas”, diz o poeta, escritor e colono Joaquim Crispiniano Neto, mostrando as fotos dos animais silvestre nos lotes.
“Não queremos, não temos interesse, não sabemos quem são estes advogados e vamos acionar nossa assessoria jurídica para, dentro do processo legal, excluir os colonos da Vila Amazonas deste processo contra a Voltália. Não faz sentido algum”, diz o poeta e escritor Joaquim Crispiniano Neto, tendo ao seu lado, José Hélio Morais da Costa, o Cabo Hélio; Américo Viana de Souza, o Doutor, e José Varela da Silva, as principais lideranças da comunidade da Vila Amazonas.
Os três advogados, em nome da CUT, FETARN e SAR, alegam que a presença dos aerogeradores de energia fez reduzir as abelhas, consequentemente a produção de castanha e de caju, outra informação que os moradores da Serra do Mel contestam com dados oficiais. O IBGE aponta que a Serra do Mel produziu 19,5 mil de toneladas de castanha e cerca de 100 toneladas de mel de abelha no ano de 2023. “Aqui, quando se parte uma melancia nos pomares, verdadeiros enxames aparecem para consumir esta melancia. Isto pode ser testado em qualquer região da Serra do Mel”, diz Cabo Hélio, um dos maiores especialista em apicultura do Rio Grande do Norte. “Não houve fuga de abelha”, diz Cabo Hélio.
Na Ação Civil Pública, os advogados alegam que ao arrendarem suas terras para as eólicas, os agricultores seriam excluídos dos benefícios do INSS e também não teriam mais acesso a crédito dos bancos oficiais. Esta é outra informação que, na prática, não condiz com a realidade. Só na Vila Amazonas, a reportagem do Portal Mossoró Hoje encontrou mais de 20 pessoas que recebem pelo arrendamento que se aposentaram nos últimos anos. É o caso do próprio José Hélio Morais Costa, o Cabo Hélio. Ele explica que também não existe restrição impostas pelos bancos oficiais, quando aos pedidos de empréstimos para plantar e colher a nenhum colono da Serra do Mel.
Ainda na peça de acusação, a CUT, FETARN E SAR, através dos advogados que assinam o documento, dizem que a Voltaria fracionou os parques na Serra do Mel para facilitar o pedido de licença ambiental no IDEMA e que as torres estão perto demais das casas. Segundo eles, o correto seria instalar as torres numa distância mínima de 2 km das casas. Pede na ação, que as torres, que pensam mais de 300 toneladas cada uma, sejam removidas.
A Voltalia se defende, dizendo que as torres estão instaladas na distância permitida pela Legislação Brasileira das residências, que o fracionamento do pedido de licença ambiental ao IDEMA ocorreu por dois motivos principais: a própria legislação exige que as licenças sejam por parque ou usina e o segundo fator, é que os pedidos de licenças ao IDEMA seguiram a ordem dos leilões de energia e a posterior instalação de cada parque nos últimos 10 anos.
Ainda conforme a peça de defesa da Voltalia no processo, uma empresa especializada faz aferição regular do ruído das torres da Serra do Mel, além de entrevista com os moradores para saber se existe alguma insatisfação. “Isto está previsto no contrato e este barulho das torres é insignificante. Para se ter uma ideia, um ventilador ligado dentro do quarto faz duas vezes mais barulho do que uma torre”, diz Crispiniano Neto, que espera que a Justiça determine o arquivamento desta Ação Civil Pública, que ele entende “ser uma verdadeira fraude, pois não nos representa e, em sua fundamentação, apresenta informações que não condiz com a realidade da Serra do Mel”.
A Voltalia não se pronunciou oficialmente na mídia a respeito do assunto. Está se defendendo no processo, através de seus advogados. Entretanto, especialistas consultados pelo MH, apontam que a empresa está reduzindo drasticamente na produção de energia em função dos cortes bruscos feitos pela ONS, consequentemente o seu faturamento e, na hipótese deste processo ter andamento na Justiça, visualizam a inviabilidade da continuidade das atividades na Serra do Mel, um prejuízo gigantesco do ponto de vista econômico, social e princialmente ambiental, pois produzem energia limpa.
Os advogados querem que a indenização de R$ 106.425.000,00, na hipótese de o juízo reconhecer a procedência da ação deles, seja depositado num fundo a ser criado e administrado por eles e o Ministério Público Estadual do RN. Outro pleito dos advogados, é que a Justiça determine que 15% do valor das indenizações, sejam ela qual for, seja destinado a eles, pelos serviços prestados no processo.