19 ABR 2024 | ATUALIZADO 18:25
ESTADO
08/03/2019 17:19
Atualizado
08/03/2019 17:36

Por pagar obras não executadas, prefeito vira réu no Tribunal de Justiça

Prefeito Abelardo Rodrigues, o filho, o advogado e empresários "amigos", contrataram obras de recuperação do ginásio e escolas, pagaram e não executaram, tendo desviado os recursos, segundo denúncia do MPRN
Prefeito Abelardo Rodrigues, do Alto do Rodrigues, que já está no cargo por força de uma liminar, vira réu em processo no TJRN por contratar obras, não executar e pagar integralmente, desviando os recursos, isto conforme delação premiada de um dos envolvidos no esquema

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte recebeu grave denuncia (Ação Penal Originária n° 2017.006939-8) contra o prefeito Abelardo Rodrigues Filho, do município do Alto do Rodrigues, e seus auxiliares (entre eles o próprio filho) por simular obras públicas para desviar milhões dos cofres públicos.

Na denúncia do Ministério Público Estadual, assinada pelo promotor Eudo Rodrigues Leite, com base em documentos apreendidos na Operação Lamas nas Ruas e delação premiada, aponta com precisão que o réu e os co-réus contratavam obras de reforma, não executavam, falsificavam documentos públicos, tiravam Notas Fiscais e desviavam os recursos públicos.

O Réu

Abelardo Rodrigues Filho

co-réus

Sérvulo Nogueira Neto (advogado do prefeito)

David Rodrigues de Paula Júnior

Wilson Rodrigues (filho do prefeito)

Glênio Fernandes de Medeiros

Rudney Leonez da Silva

Francisco de Assis de Oliveira Ferreira

O que segue abaixo é a narrativa do juiz relator Amaury Moura Sobrinho, tomando como base o relatório do promotor de Justiça Eudo Rodrigues Leite. Destaca, com precisão, como os desvios aconteciam, quem praticavam estes crimes e o intervalo de tempo que isto aconteceu, subtraindo os recursos do município do Alto do Rodrigues.

Em sua narrativa, o Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte afirma que deflagrou a Operação "LAMAS NAS RUAS", fruto de investigações conduzidas nos seguintes autos a) Procedimento Investigatório Criminal n.° 021/2013-PGJ (Processo n.° 2015.015515-0); b) Ação Cautelar de Quebra dos Sigilos Bancário e Fiscal (Processo n.° 2015.015514-3); c) Ação Cautelar de Interceptação Telefônica (Processo n.° 2016.010767-1); d) Colaboração Premiada (Processo n.° 2016.017036-8 e e) Ação Cautelar de Busca e Apreensão (Processo n.° 2017.001426-9).

Diz que a apuração se iniciou com a apresentação de representação criminal por vereadores alto-rodriguenses, na qual apontavam que a obra da reforma do Ginásio de Esportes Ivanildo Bezerra da Silva não foi integralmente executada e que a empresa vencedora do suposto certame, a El Shadai Construções e Empreendimentos Ltda, pertence a um correligionário da família do Prefeito Abelardo Rodrigues Filho, havendo indícios de montagem de licitação e pagamento irregular.

Alega que, após inúmeras oitivas, análises de dados bancários e de documento apreendidos nos endereços dos investigados, verificou-se que o Sr. Abelardo Rodrigues Filho, desviou, em abril e maio de 2013, para si e em proveito alheio, rendas públicas da obra de reforma do ginásio poliesportivo citado, beneficiando o amigo e correligionário Oto Soares de Mendonça, ciente de que o dinheiro repassado pagaria despesas pessoais dos próprios denunciados, inclusive o percentual devido à empresa El Shadai Construções e Empreendimentos Ltda, para simular a execução do contrato Administrativo n.° 068/2013, referente a reforma do ginásio antedito.

Pontua que o advogado Sérvulo Nogueira Neto. concorreu com as condutas ilícitas apontadas auxiliando o beneficiário Oto Soares de Mendonça, com quem mantinha relações negociais, mediante a cessão da própria conta pessoal para receber os valores desviados da Prefeitura de Alto do Rodrigues/RN de forma a viabilizar pagamentos de despesas pessoais de Oto Soares de Mendonça e do Prefeito denunciado.

Noticia que para assegurar os desvios de recursos públicos, em março de 2013, o Prefeito denunciado, em concurso com Oto Soares de Mendonça e David Rodrigues de Paula Júnior outros dois empresários e servidores públicos municipais, fraudou, mediante prévio acerto entre os licitantes e montagem do procedimento licitatório, o caráter competitivo do Convite n.° 024/2013, deflagrado para a construção do Ginásio de Esportes Ivanildo Bezerra da Silva, homologando a licitação fraudulenta com o indisfarçável propósito de lhe atribuir validade, de maneira a favorecer a El Shadai Construções e Empreendimentos Ltda, empresa representada no certame por Oto Soares de Mendonça.

Afirma que durante as investigações descobriu-se que a empresa El Shadai Construções e Empreendimentos Ltda não executou a obra de reforma do Ginásio antedito, cujo valor global foi fixado em R$ 123.489,99 (cento e vinte e três mil, quatrocentos e oitenta e nove reais e noventa e nove centavos), sendo falsas as Notas Fiscais de Serviço anexadas aos processos de pagamento da Prefeitura, fato do qual tinha ciência o Prefeito, o Secretário de Obras e o Engenheiro Civil fiscal do contrato. Mas que fora descoberto que a construtora contratada recebera apenas aproximadamente 8% (oito por cento) do valor global da obra, e que grande parte dos recursos restantes foi desviada para a conta pessoal de Sérvulo Nogueira Neto o, advogado com atuação na região e que também presta serviços ao Município de Alto do Rodrigues/RN.

Diz que com o avançar das investigações, o Órgão Ministerial celebrou acordo de colaboração premiada com David Rodrigues de Paula Júnior, sócio oculto e gestor de fato da empresa El Shadai Construções e Empreendimentos Ltda, vencedora do Convite n.° 24/2013, tendo colhido outros elemento de provas que confirmam a montagem fraudulenta do Convite n.° 024/2013.

Pontuou que o depoimento do colaborador David Rodrigues de Paula Júnior descreve Oto Soares de Mendonça como o operador do Prefeito Abelardo Rodrigues Filho neste esquema de desvio de dinheiro do Município de Alto do Rodrigues, e que, além da reforma do ginásio Ivanildo Bezerra, pelo menos outra obra pública daquele município também foi alvo de direcionamento e desvio de verba pública, a saber o Convite 001/2013 (serviços de recuperação das escolas: Walfredo Gurgel; Maria Venâncio; Francisco de Oliveira e Joaquim Medeiros, pertencentes à rede municipal de ensino de Alto do Rodrigues), no qual figura como licitante a El Shadai Construções e Empreendimentos Ltda..

Apontou que a GM Construções e Serviços Ltda tem como sócio-administrador Glênio Fernandes de Medeiros e foi a empresa responsável não somente pela elaboração do memorial descritivo e cronograma da reforma do Ginásio Poliesportivo Ivanildo Bezerra da Silva, como também atestava as medições na obra para fins de pagamento, e que, no interior das pastas nas quais Glênio arquivava anotações e documentos sobre as obras executadas em Alto do Rodrigues, foi encontrado um apontamento assinado pelo citado engenheiro, com data de 08/04/2013, em que lista retificações a serem efetuadas no procedimento licitatório Convite n.° 024/2013, no que aparentam ser documentos internos da própria Administração Pública Municipal, como cronograma físico-financeiro da obra, relatório fotográfico e planilha com as composições de preços unitários.

Afirma que tal documento reforça a constatação de fabricação coordenada do procedimento licitatório, pois o valor da obra e o item 3.6.2 da Planilha Orçamentária, referidos no documento apreendido, são os que haveriam de constar na proposta da empresa vencedora, qual seja, empresa El Shadai Construções e Empreendimentos Ltda, cuja contratação era esperada, tendo sido realizadas as observações feitas pelo engenheiro contratado por aquele Município.

Prossegue afirmando que a investigação preliminar revelou também que o Prefeito denunciado, logo no primeiro semestre, associou-se, em quadrilha, com empreiteiros, servidores públicos, secretários do Município de Alto do Rodrigues para o fim específico de cometer crimes de fraude à licitação (Lei n.° 8.666/93, art. 93) e desvio de recursos públicos (Decreto-Lei n.° 201/67, art. 1.°, in fine), infrações penais essas que eram operacionalizadas pelo agente Oto Soares, sempre em licitações pertinentes a obras públicas lançadas pelo Poder Executivo Municipal.

Cita, além dos associados em quadrilha acima referidos (Sérvulo Nogueira Neto e Glênio Fernandes de Medeiros), as pessoas de:

A) Wilson Rodrigues, filho e Secretário de Governo do Prefeito Abelardo Rodrigues Filho, cuja função consiste em controlar o andamento das obras no Município de Alto do Rodrigues e a liberação dos pagamentos às empresas contratadas; no Convite n.° 103/2013 fraudado pela quadrilha, recebeu email de Oto, no qual consta o orçamento da obra que serviu para montagem do procedimento; ditava as obras cuja execução seria tocada pelo grupo criminoso e, na repartição interna de tarefas da quadrilha, cabia-lhe a função de arrecadar o dinheiro desviado das obras do Município de Alto do Rodrigues, agia como longa manus do Prefeito na arrecadação do produto do crime;

B) Rudney Leonez da Silva, o qual exercia a função de Presidente da CPL à época dos fatos; assinava as atas das sessões e outros documentos das licitações viciadas, como se os atos e procedimentos houvessem realmente ocorrido, com importante papel na montagem dos procedimentos;

C) Francisco de Assis de Oliveira Ferreira, Secretário de Obras do Município à época dos fatos; assinava os memorandos de abertura dos procedimentos licitatórios viciados; cabia-lhe atestar a execução dos serviços para a liberação dos pagamentos às empresas; exercia o papel de fiscal dos contratos e, nessa qualidade, assinava os boletins de medição, ciente de que os quantitativos mencionados não correspondiam à realidade.

Acentua o Representante Ministerial que restou claro que as condutas perpetradas pelo denunciado Abelardo Rodrigues filho estão incursa na reprimendas dos artigos 90 da Lei de Licitações n.° 8.666/93, art. 1.°, inciso I, do Decreto-Lei n.° 201/67, e art. 288 do CP, aplicados na forma do artigo 69 do CP.

Sustenta que as condutas delituosas atribuídas aos demais integrantes da quadrilha guardam autonomia em relação à conduta imputada ao Denunciado, motivo pelo qual requer a cisão do feito/desmembramento em relação a Sérvulo Nogueira Neto, David Rodrigues de Paula Júnior, Wilson Rodrigues, Glênio Fernandes de Medeiros, Rudney Leonez da Silva e Francisco de Assis de Oliveira Ferreira, bem como no tocante aos sócios e administradores das pessoas jurídicas que participaram da fraude ao Convite n.° 024/2013 – PMAR (JE Construções Ltda – ME e M&I Empreendimentos e Serviços Ltda., autorizando-se o compartilhamento das provas produzidas nos Processos n.° 2015.015514-3, 2016.010767-1, 2016.017036-8 e 2017.001426-9 com a Promotoria de Justiça de Pendências, órgão com atribuição para oferecer eventual ação penal contra os réus não detentores de prerrogativa de foro.

Ao fim, requereu o recebimento da denúncia e, ao final da fase instrutória, pugna pela procedência daquela com a consequente condenação de Abelardo Rodrigues Filho as penas previstas nos crimes do art. 90 da Lei n.° 8.666/93; do 1°, inciso I do Decreto-Lei n.° 201/67 e art. 288 do CP, aplicados na forma do art. 69 do CP. Postulou, ainda, a incidência do art. 91, I do CP, tornando certa a obrigação de indenizar o dano causado pelos crimes praticados pelo acusado, o qual estimou em relação aos crimes descritos na peça acusatória à ordem de R$ 100.540,86 (cem mil, quinhentos e quatro reais e oitenta e seis centavos).

Às fls. 589/692v, com fundamento no parágrafo único do art. 2.° da Lei n.° 8.038/90, bem como nos precedentes jurisprudenciais, foi deferido o pedido lançado na pela acusatória de desmembramento do feito em relação aos agentes que não possuem prerrogativa de foro neste Tribunal (Sérvulo Nogueira Neto, David Rodrigues de Paula Júnior, Wilson Rodrigues, Glênio Fernandes de Medeiros, Rudney Leonez da Silva e Francisco de Assis de Oliveira Ferreira), bem como no tocante aos sócios e administradores das pessoas jurídicas que participaram da fraude ao Convite n.° 024/2013 – PMAR (JE Construções Ltda – ME e M&I Empreendimentos e Serviços Ltda, autorizando-se, ainda, o compartilhamento das provas produzidas nos Processos n.° 2015.015514-3, 2016.010767-1, 2016.017036-8 e 2017.001426-9 com a Promotoria de Justiça de Pendências, órgão com atribuição para oferecer eventual ação penal contra os réus não detentores de prerrogativa de foro.

Inicialmente notificado, a despeito da advogada atuante ter feito carga dos autos e permanecido em posse destes por mais de 05 meses, transcorreu o prazo para apresentação de defesa sem qualquer manifestação do denunciado. Para evitar futura alegação de nulidade, foi determinada a intimação pessoal do acusado a fim de que constituísse novo causídico para que apresentasse resposta à acusação.

Às fls. 91/130, o denunciado apresentou defesa sustentando, preliminarmente, a nulidade e ilegitimidade do acordo de delação premiada firmado com David Rodrigues de Paula Júnior; absorção do delito de fraude à licitação pelo crime de responsabilidade; ausência de desvio de recursos em favor do réu e de dano ao erário; a conclusão da obra contratada pelo Município de Alto do Rodrigues. Pugnou pela rejeição da peça acusatória.

Com vista dos autos, o Parquet arguiu a intempestividade da defesa, bem como reiterou os termos da peça acusatória e pugnou pelo recebimento da denúncia (fls. 672/687).

Diante das fortes acusações, baseadas em provas materiais e testemunhais, o desembargador Expedito Ferreira de Sousa, no dia 12 de dezembro de 2018, recebeu a denúncia, que havia sido relatada pelo desembargador Amaury Moura Sobrinho.

Está escrito no Acordão:

“À unanimidade, em receber a denúncia ofertada pelo Ministério Público em face de Abelardo Rodrigues Filho, pela prática, em tese, dos delitos tipificados no art. 90 da Lei n.° 8.666/93; do 1.°, inciso I do Decreto-Lei n.° 201/67 e art. 288 do CP, aplicados na forma do art. 69 do CP, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste”, descreve a decisão do TJRN.

Este processo, segundo informa o Tribunal de Justiça Estado, está concluso para julgamento, o que deve acontecer nas próximas semanas, com sério risco de prisão do prefeito Abelardo Rodrigues, do filho Wilson Rodrigues, assim como dos demais que dilapidaram os cofres públicos.


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